sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Patrulha antigay em Moscou

Domingo, 15 julho de 2007

Praça que serve como ponto de encontro de homossexuais vira epicentro de xenofobia na Rússia



Eles chegam para limpar a praça. Pouco depois das 19 horas, uma dezena de jovens cristãos ortodoxos se reúne em frente ao monumento de um parque no centro de Moscou, demarca o terreno e expulsa todos aqueles que estão sentados nas escadas, conversando ou bebendo cerveja. Desde meados de junho, esses jovens, que se autodenominam 'georgiyevtsy', numa homenagem a São Jorge, santo patrono de Moscou, patrulham a área da pequena capela ortodoxa para expulsar os gays que aparecem por ali para encontrar amigos ou em busca de sexo.

'Eles se reúnem em torno de um local sagrado e praticam atos escandalosos', afirma Diana Romanovskaya, de 19 anos, organizadora da patrulha, que iniciou esse movimento com outros jovens depois que os defensores dos direitos dos gays tentaram uma manifestação em Moscou, em maio.

Os sinais nascentes do ativismo gay na Rússia, incluindo manifestações e uma presença cada vez mais constante na internet, provocaram uma reação política e social, estimulada por conhecidos líderes políticos, como o prefeito de Moscou, Yuri Luzhkov.

A patrulha em torno da capela, que também é um monumento aos soldados mortos na guerra entre russos e turcos, no século 19, atraiu membros de vários grupos nacionalistas, que se misturaram ao movimento antigay, mas cuja batalha é contra os imigrantes do Cáucaso que, afirmam, ameaçam da mesma maneira a cultura e as tradições da Rússia.

Numa sexta-feira, jovens russos que a mídia descreve como skinheads iniciaram uma batalha de rua com imigrantes do Cáucaso perto da capela. Cerca de 100 jovens se envolveram na briga e um adolescente armênio foi ferido a golpes de punhal. A polícia prendeu mais de 40 pessoas.

Essa violência da sociedade mostrou que existe um paralelo entre a atual hostilidade para com gays e lésbicas e a violência dirigida contra as minorias étnicas que vivem na Rússia, onde a xenofobia se intensificou bastante desde o colapso da União Soviética.

Igor Kon, sociólogo russo especialista no tema da homossexualidade, afirmou em recente artigo que o comportamento antigay no país ilustra a grande desconfiança da sociedade com relação aos grupos marginalizados. 'A homofobia deixa bem claro isso', diz Kon. Para ele, eventos como a manifestação pelos direitos dos gays servem de 'pretexto para mobilização de forças ultranacionalistas'.

'ATO SATÂNICO'

A manifestação dos gays foi proibida pelo prefeito de Moscou, que taxou eventos desse tipo de 'atos satânicos'. Os organizadores do protesto - uma coalizão de russos e europeus - foram presos imediatamente ao se reunirem na frente da prefeitura, em 27 de maio, pedindo permissão para o ato público. Enquanto policiais e tropas antichoque observavam, nacionalistas e religiosos extremistas atacaram os poucos manifestantes reunidos perto dali e que tinham desafiado a interdição.

Nesse mesmo dia os 'georgiyevtsky' realizaram seu próprio protesto na capela, que chamaram 'Pelo Amor Autêntico'. Condenaram o que chamam de propaganda homossexual e anunciaram que passariam a patrulhar o parque.

Desde então, eles se reúnem todos os fins de tarde na capela com um pequeno mas crescente grupo de nacionalistas, políticos da direita radical e outros simpatizantes para reafirmar que a Rússia, um país cada vez mais hostil ao que considera valores ocidentais importados, não está disposta a aceitar os direitos das minorias sexuais.

Referindo-se à fracassada manifestação tentada pelos homossexuais, Romanovskaya afirmou que, 'se permitirmos eventos desse tipo em Moscou, mostraremos para todos que nos tornamos como o resto da Europa. Nosso país é especial. Temos valores culturais'.

Uma tarde, dois jovens gays sentados num muro no canto da praça observavam o grupo que recolhia as garrafas vazias e o lixo deixado em torno da capela. Um deles disse que resistirá a qualquer pressão para deixar a praça. 'Temos amigos aqui. Mesmo se são gays, isso não significa que devem ser expulsos', disse.

Os jovens gays começaram a se reunir em torno da capela da Praça Ilinsky há mais ou menos dez anos, quando o local de encontro usado anteriormente, diante do conhecido Teatro Bolshoi, foi interditado por uma construção, conta Eduard Mishin, editor da mais conhecida revista gay da Rússia.

Em 1993 o governo russo anulou uma lei promulgada na era Stalin que criminalizava a 'sodomia'. No entanto, até agora isso não provocou um abrandamento da postura da sociedade em relação à homossexualidade masculina.

No caso do lesbianismo, ele continua sendo totalmente repudiado na Rússia e segue completamente fora do discurso de movimentos sociais.

http://www.estado.com.br/editorias/2007/07/15/ger-1.93.7.20070715.6.1.xml

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